Saboreando
“Pergunte ao pó” de Jonh Fante. A história se passa com Arturo Bandini, um
jovem escritor de vinte anos. Ele sai do Colorado para Los Angeles, aluga um
quarto e passa muitas e muitas dificuldades financeiras e também no amor. Vive
contando as moedinhas a espera de algum cheque da mãe ou de algum editor que
aceite finalmente seus escritos. Uma leitura apaixonante, para aqueles que
acreditam no próprio sonho e arriscam-se por eles, custe o que custar. Charles
Bukowski que faz o prefácio da obra afirma que “Pergunte ao pó” é escrito das
entranhas e do coração, tamanha a paixão e verdade do texto.
Confira a excelente resenha da escritora Soraya Feliz. E acesse o blog da escritora e confira outros textos. http://prosamagica.blogspot.com.br
Revisitando Pergunte ao Pó
Pergunte ao Pó, do norte americano John Fante me foi
presenteado quando era apenas uma jovem de 22 anos. Recém saída de uma
faculdade de propaganda, trabalhando na área de criação e texto, provida de
todos os sonhos e fantasias que alguém nesta idade se permite ter.
É claro que o texto de alguém que tem 22 é bem diferente de
outro que aos 40 trabalhou arduamente em jornais e revistas do país.
Experiência, ao contrário que muitos pensam, conta e muito.
Pergunte ao Pó foi um presente do amigo e jornalista extremamente
talentoso, Jorge Pinheiro, que atento a minha paixão pelo texto tentou
orientar-me no caminho, que só hoje percebo em sua essência:- o romance de
ficção.
Em sua belíssima dedicatória ele escreveu:
“Eis um texto super atual, pois, embora tenha sido escrito
em 1939. Para nós de texto, é um prazer.”
Só hoje entendo a dimensão deste prazer. Eu não conhecia o
autor e como todo recém formado, tinha certa aversão a literatura americana
(hoje, ao lado dos ingleses eles são a minha grande paixão). Na época havia
tentado arduamente ler Ernest Hemingway, mas achava chato demais, rebuscado em
excesso com detalhes corriqueiros de um cotidiano que para mim era
completamente desconhecido e indiferente.
Confesso que a introdução do poeta Paulo Leminski contribuiu
para que realizasse a leitura. E, depois de ler as duas primeiras páginas da
história, um pequeno lapso de tempo real se passou até que suspirando de emoção
chegasse ao final.
Foi ai que conheci Arturo Bandine, um jovem americano
descendente de Italianos que mora em Los Angeles, e sem um tostão no bolso.
Seus pertences são poucas peças de roupa, uma máquina de escrever e cópias de
seu único conto publicado.
Lá ele conhece a garçonete mexicana, Camilla. Bandine passa
a frequentar o bar no qual Camilla trabalha. Esses encontros são sempre
recheados de brigas e ofensas que, na maioria das vezes, são reflexos da
situação social que ambos vivem: - estrangeiros em um país com tendências a
xenofobia. É bom lembrar que a história está ambientada na década de 30.
Bandine é um jovem que se atormenta pela imagem que
construiu de si mesmo, um escritor que deseja ser famoso e rico, mas a única
coisa de real que possui são seus parcos pertences e seu único conto publicado.
Ele não conhece ninguém e muito menos desperta interesse em
quem quer que seja. Quer possuir muitas mulheres, mas têm medo delas, a ponto
de assustar-se com as investidas de Camilla. A verdade nua e crua é que Arturo
Bandine é um homem virgem.
Desesperado, sem nenhum dinheiro no bolso ele escreve para o
editor que publicou seu conto, toda sua angústia, tristeza, desalento e
desventuras na desastrada tentativa de ser escritor. Então a sorte sorri para
ele. O editor publica sua carta, retirando apenas a saudação e o final dela,
como se fosse um conto e envia a seguinte carta:
“Prezado senhor Bandini: Com sua permissão, removerei a
parte inicial e o fim de sua longa carta e a publicarei como um conto em minha
revista. Parece-me que o senhor fez um belo trabalho aqui. Acho que As Colinas
Perdidas de Outrora serviria como um excelente título. Meu cheque vai anexo.
Sinceramente seu, J.C. Hackmuth”.
Então, ele conhece Vera, uma mulher misteriosa que some de
sua vida da mesma maneira que apareceu – repentinamente. No entanto Vera
promove em Bandine uma mudança tão forte que o leva a escrever um romance sobre
ela, que é imediatamente publicado pelo seu editor. Seu sonho começa a se
realizar.
Até hoje me lembro da impressão que a trama me provocou.
Primeiro uma sensação de estranhamento, surpresa. Fante descrevia um mundo que
eu nem imaginava existir. Naquele momento eu era o Bandine da vida real que
precisava sair ao mundo em busca de vivência. Talvez por isso, só por isso,
naqueles tempos nunca me imaginei como escritora.
Hoje, ao reler Pergunte ao Pó, a sensação é outra. Não mais
o estranhamento. Em seu lugar surge o prazer. As construções das frases, da
trama, do “fio condutor da história” nos levam a se deliciar com tamanha
capacidade, com tamanha ousadia para quem escrevia nos “recatados” anos 30, que
fica impossível descrever o talento criativo de Fante.
A tradução de Paulo Leminski dispensa qualquer comentário.
Não li a tradução atual, portanto não farei comparações. Há também um prefácio
magnífico do autor norte americano Charles Bukowski.
Independentemente de você, leitor, encontrar ou não esta
edição que estou falando, John Fante é prazer garantido em qualquer tradução
para quem ama se distrair com a literatura e para quem faz, ou quer fazer dela,
sua ferramenta de trabalho.
Foto no topo do texto: Capa da edição esgotada da Editora
Brasiliense
Foto no final do texto: Capa da Edição Atual – Editora José
Olympio
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