segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Uma análise semiótica –“Eu sei que vou te amar”

Analise do samba "Eu sei que vou te amar " de Vinicius de Moraes e Tom Jobim


 Quando nos deparamos com uma obra cultural e atribuímos a ela um considerável valor, buscamos entender por meio de análises minuciosas seu processo de construção. Acreditamos assim, que tal conhecimento trará satisfação e somará a importância dessa obra. Para estudantes e profissionais de Letras esse procedimento é comum. O professor de língua portuguesa Mauro Dellal faz análise de obras literárias em sites. Formado em Letras Português Literatura pela Faculdade Estácio de Sá do Rio de Janeiro, Dellal está cursando atualmente a Pós-Graduação em língua portuguesa e Lingüística  na mesma Instituição. 

Numa dessas viagens de investigação cultural, Dellal analisou o texto de Vinicius de Moraes e Tom Jobim de 1958 “Eu sei que vou te amar”. A intenção foi descobrir como os compositores usaram a linguagem musical para produzir um determinado efeito. Dellal compara a boa música ao bom texto “A qualidade está livre da superficialidade não intencional que marcam as obras feitas a partir de uma falta de reflexão e de interesse em querer dizer algo um pouco mais profundo do que simplesmente tocar os nossos sentimentos” explica.



Eu sei que vou te amar,
Por toda a minha vida eu vou te amar,
A cada despedida, eu vou te amar,
Desesperadamente, eu sei que vou te amar.
E cada verso meu será
Pra te dizer, que eu sei que vou te amar,
Por toda a minha vida.
Eu sei que vou chorar,
A cada ausência tua eu vou chorar,
Mas cada volta tua há de apagar
O que essa tua ausência me causou.
Eu sei que vou sofrer
A eterna desventura de viver
À espera de viver ao lado teu,
Por toda a minha vida.” – Vinicius de Moraes e Tom Jobim - 1958

Síntese da analise – 
1 – Para afirmar sua certeza os autores utilizam a repetição da frase “Eu sei que vou te amar”.

2 – Na sequência utilizam a elipse dos termos “sei que”

3- Amará: por toda sua vida, em cada despedida e de forma desesperada, no sentido de total dedicação. A melodia que acompanha esses versos se baseia nisso: repetição e afirmação. A cada dizer da frase principal (eu vou te amar) as notas são, também, repetidas como algo imutável, definitivo. Mas não é só isso; as frases se repetem (melodicamente falando) mudando de escala a cada verso da estrofe. Isso causa o efeito de uma afirmação incontestável, sempre crescente.


4 - As estruturas das frases, em sílabas poéticas são: 6-10-10-12. A estrutura de notas musicais acompanha esse desenho, e a altura da frase musical também se eleva a cada descrição do texto.


5 A ausência de modulações (mudanças de tons) bruscas dá à música um molde compacto. Apesar de o poema se referir aos opostos amar / não ser amado, essa oposição não se baseia em alterações de estado d’alma. Baseia-se, sim, em algo único, em algo gigantesco, em um amor indestrutível, em um amor auto-suficiente, que regenera em si mesmo. Por assim dizer, a peça mostra total equilíbrio e se mantém pela sua simplicidade (algo que não é fácil de produzir). O simples aqui não é, absolutamente, falta de genialidade, nem falta de inspiração; é, antes de tudo, consciência de limites exatos que valorizam algo prosaico e belo.

Análise na integra : http://pt.shvoong.com/humanities/1834255-eu-sei-que-vou-te/


01) Lona: Qual o processo de análise que foi utilizado? Que instrumentos foram usados como base para construção deste texto?
Professor Dellal: O processo utilizado foi o de teoria de literatura comparada. Aqui, literatura significa tudo que pressupõe um texto. Uma música é um texto, no que se refere à mensagem que passa, utilizando sua própria linguagem. Não é o único método, mas um dos possíveis. Não houve instrumento utilizado; apenas a melodia da canção era o mais importante.

02) Lona: Qual a forma de realização deste processo de verificação?
 Professor Dellal: Neste método, procuram-se ligações entre as duas linguagens _texto escrito e texto sonoro. O que uma influencia na outra. Em meu trabalho, procurei mostrar o equilíbrio entre as duas linguagens, partindo sempre da letra para a melodia, pois está claro que esta ordem era a possível para este tipo de análise.

 03) Lona: Trabalhar o contexto histórico e o ambiente do autor na época que foi escrito o texto, proporciona uma melhor análise sobre o texto? Contribui de alguma forma?
Professor Dellal: Para a ideia a que me propus, isso era irrelevante. O trabalho foi estritamente formal e de conteúdo explícito. Mas, sim; em uma análise em que se queira extrair a linha filosófica e suas consequências, o contexto histórico é importante.

04) Lona: Quando é feita um estudo de texto como esse é necessário pensar na questão cultural que está inserido o autor para entender detalhes da obra? Esse processo é percebido neste texto de Vinicius e Jobim?  Por exemplo, o amor exagerado, em que sociedade é visto isso?
 Professor Dellal: Como afirmei anteriormente, o análise foi apenas da forma e suas ligações internas. Interessou-me o modo como esse amor exagerado, descrito na letra, se harmonizou com a melodia. Não creio que esse processo da questão cultural possa ser percebido no poema, pois o autor o trata com parâmetros universais.

05) Lona: Com base neste trabalho, quais detalhes você citaria que contribuem para a beleza da composição?
 Professor Dellal: O cuidado com que foi feita a harmonia entre a letra e a melodia. Esse é o detalhe principal. Uma boa canção é, para mim, uma harmonia entre os dois extremos que é a letra e melodia. Em uma canção, está claro que a letra tem a importância principal, pois é ela quem garante a transmissão da mensagem. Dizendo de uma forma diferente, a melodia respeita a letra. Não se sobrepõe a ela, mas sim a potencializa.

06) Lona: Como se dá o processo de onda lírica no texto?
 Professor Dellal: No texto escrito, a onda lírica é marcada pela sugestão de repetição do sentimento, reiterado pela utilização de elementos lingüísticos que guardam em si essa marca “eu sei, toda a minha vida...” junto a uma descrição de contrários (amar/sofrer).

07) Lona: Qual a importância do movimento cíclico que há na música e onde ele aparece?
Professor Dellal: Aí está o segredo da harmonia: O movimento cíclico está na música inteira.

08) Lona:  O que faz dessa composição refinada e ao mesmo tempo popular?
 Professor Dellal: Justamente esta harmonia entre letra e melodia. Além disso, se olharmos separadamente, tanto a melodia como a letra são elementos que sobrevivem sozinhos. O refinamento se dá, então, pela forma, e o fator popular, pela simplicidade.

09) Sua experiência de mais de 20 anos com a orquestra da Petrobrás contribuiu de forma a facilitar a estudo dessa música?
Professor Dellal:Não creio que apenas o conhecimento musical seja possível para esse tipo de análise, já que o método tratou de linguagens comparadas. Mas, de certa forma, porque, ao se escutar tantas obras bem compostas, tendo sempre uma visão crítica-reflexiva das mesmas, acabamos adquirindo certo conhecimento da estrutura da música ocidental.

Repórter Eli Antonelli/Publicado jornal Lona - Grupo Positivo 


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